Raissa Lennon

Raissa Lennon
"siga seus próprios sonhos, porque ninguém pode viver o sonho do outro"

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Sobre consumo

Quando olhei a fatura do meu cartão de crédito este mês, me senti que nem a personagem Siobhan Healey, do texto “O falso alvorecer da liberdade”, incluído no livro “44 cartas do mundo líquido moderno”, do sociólogo Zygmunt Bauman. Healey fez uma dívida gigantesca em seu cartão de crédito, depois tirou outro cartão de crédito para cobrir a dívida do primeiro e depois ela fez um empréstimo para cobrir a dívida dos dois cartões.
No fim, estava devendo 26 mil dólares australianos (cerca de R$ 40.000) para o banco. Calma. Não cheguei a esse ponto, nem perto dele. Mas fiz uma dívida desnecessária (e maior do que eu ganho no mês), que eu simplesmente nem lembro como conseguir gastar tanto em tão pouco tempo.

Para a jovem Siobhan de 23 anos, ter um cartão de crédito significava o “alvorecer de sua liberdade”, é como se ela pudesse abraçar o mundo inteiro de maneira simples e rápida. Depois, ela percebeu o preço (alto) que se paga por essa tal “liberdade”. Ter um cartão de crédito dá essa sensação mesmo, dá para se comprar quase tudo com ele. E digitando apenas uma senha, você já tem um livro, um cd, uma roupa, etc.
Banco ganha dinheiro com os juros e empréstimos, todo mundo sabe disso. Tenho cartão de crédito há pouco mais de um ano, e nesse período, acho que já me ligaram umas oito vezes, me oferecendo empréstimos, seguro de vida e um monte de outras coisas que eu nunca solicitei.

Eles sempre se deram mal comigo porque eu nunca aceitei nenhum empréstimo e sempre paguei minhas contas em dia, mesmo quando estavam altas. Mas uma hora você dança. E a minha hora chegou. Nunca tinha comprado tanta coisa assim. Nunca gostei de comprar roupa de marca, sapato de grife, ou bolsas luxuosas. O máximo que gasto com isso é comprando uma blusa de banda e All Star. Mesmo que você seja um dos caras mais socialistas do século, você terá um ponto fraco (tirando os franciscanos). Afinal, não se anda sem roupa por aí. O meu ponto fraco se resume a quatro coisas: Livros, música, cinema e alimentação. É certo que comprar livros é bom, mas ainda assim, temos que nos privar em determinadas situações.

Bauman analisa o risco do cartão de crédito, principalmente para os mais jovens, porque os bancos fazem de tudo para que você compre e se endivide. E o jovem, que ainda não é mais criança e nem adulto, não sabe calcular direito as consequências de suas atitudes. Em certos períodos no mês, o consumismo é mais incentivado ainda, como no período do Natal, tempo de confraternização, esperança, fé, e... compras, muitas compras. É amigo invisível pra lá, festa da empresa pra cá, ou seja, dívidas na certa.

Caverna

Outro livro de Zygmunt, trata ainda com mais afinco a questão do consumismo chamado “Vida para consumo – A transformação das pessoas em mercadoria”, pelo título já se tem uma ideia da crítica ferrenha que ele vai expor na obra. Por sinal, mesma ideia que Theodor Adorno mostra de maneira holocáustica em seu livro “Dialética do esclarecimento”, que foi elaborado junto com Max Horkheimer.

O fato é que a crítica condiz com a realidade, hoje o “ter” é mais importante que o “ser”. Se você tem um carro você tem status e ponto. As pessoas logo ligam o fato de que ter um carro é significado de felicidade e vida bem sucedida, o que é claro, nem sempre é verdade. O teólogo e escritor Frei Betto compara o consumismo com a Caverna de Platão. As pessoas são os prisioneiros que vivem dentro da caverna da falsa realidade do “ter” e não conseguem ver à luz a sua frente. Em suas palavras:

“O capitalismo, em seus primórdios, produzia em função das necessidades humanas. Não se investia em algo que o consumidor julgasse desnecessário. A superprodução inventou a publicidade de modo a inverter o processo, já não é o consumidor que busca o produto, é o produto que se impõe ao consumidor”.

Eu não queria prometer nada para o próximo ano, mas agora quero prometer uma coisa: Controlar o dinheiro que ganho. E mudar a minha forma de agir sobre o mundo. Todos nós temos que ter um objetivo na vida, melhorar enquanto seres humanos. Certo? O problema é que a nova ordem mundial fez que a gente pensasse que é normal ter gente com muita grana e gente passando fome. Não é normal. É desumano.
É. Acho que precisamos sair da caverna em 2012.

2 comentários:

Eduardo Rodrigues disse...

Nunca tive cartão de crédito e tenho muito medo de ter. XD~

Presto toda a solidariedade na sua promessa de ano bom. Que seja bem melhor que este, compa. :)

Bernard Freire disse...

Dezembro é o mês em que a burguesia brinda o consumo, o mês que mais se consome. Gostei do texto. Colocas uma situação particular com referencias de teorias que esclarece como funciona o sistema, parabéns lennon.
Que em 2012 tu ajas com a sabedoria e não com a vontade. Abraços.

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